sábado, 7 de dezembro de 2013

Capítulo 31: “O que táx a faze em cima da mãmã?”


(André)

Ainda não me tinha habituado a dormir sozinho confesso, passei anos assim mas passei durante mês e meio a dormir ao lado do David e parece que ainda hoje o sinto perto de mim. E sentir aquela mão a tocar-me era estranha, conhecia muito bem aquele toque há precisamente 19 anos, era da minha... Namorada. Não, não podia ser. Era um sonho! Até que senti um pontapé na minha barriga, o David é super-irrequieto a dormir, mas aquele pontapé não era um sonho, dói-me a barriga e os sonhos não são tão realistas. Quis tornar consciência da realidade, afastei aquele pequenino pé e confirmava-se, era o David que estava ali. Mas quando eu tinha adormecido ele não estava ali e não podia ter sido a Ana a trazê-lo, ela veio comigo no avião e embora eu não saiba as horas tenho a certeza que não teve tempo de ir buscá-lo e deitá-lo ao meu lado. Peguei na mão que estava sobre o meu corpo e coloquei a minha sobre ela e pude sentir que não era um sonho. Abri os olhos.
Era a Rita e o David. Sorri, eles estavam ali ao pé de mim e não precisava de nada mais. Dei um pequeno toque ao David e um beijinho na testa. Aqueles caracoliquinhos divertidos tinham-lhe pregado uma partida, estava mesmo um no meio da sua testa, eu afastei-o e dei um beijo. Sussurrei:

-Bom dia filhote! – Disse ainda com a voz rouca. Ele coçou o olho e abriu-o embora devagarinho e sorriu.

-Pápá Gomas. – Disse apertando os braços ao meu pescoço. –Táx bem? Ontem tavax no chão a choa, eu vi! A mãmã também choou, mas não che magoou como tu!

-Fiz um dói-dói mas estou bem, logo tenho de ir ao médico, mas já só doi um bocadinho. – Sorri, na realidade doi-a bastante mas não lhe ia dizer para não o deixar preocupado. – A mãmã chorou preocupada... Comigo?

-Chim. Ela dixe depoix de te ve a choa que quia vota paqui! Queles que a acode e pegunte?

-Não, deixa a mãmã descansar. Depois ela acorda – Tocaram á campainha. – Vou abrir a porta mas preciso que fiques aqui a toma conta da mãmã mas não faças barulho, deixa-a dormir, eu já volto! Não a deixes sair do quarto!

-Tá bem! – Fui até á porta e era a Ana.

-Bom dia! –Disse a minha “priminha”– Como estás? – Perguntou.

-Estou a recuperar, ontem foi bem pior. Obrigado – Confessei. – Vieste por algum motivo em especial Ana? – Perguntei direto.

-Vim buscar o David, para passar o dia comigo... E com o Eduardo.. – Respondeu, bem esta não contava. O David não gostou do Salvio e estava reticente em deixá-lo ir, ia com a prima e eu não sou o pai, mas sou em parte responsável por ele.

-Não sei se será boa ideia... – Disse e não me deixaram acabar a frase.

-A Ana sabe o que faz e o Salvio é boa pessoa, confio neles e se for preciso estamos aqui em casa. – Aquela voz... Era da Rita. Tinha saido do quarto e trazia ao seu colo o menino.

-Deixa chó i busca os binquedos! – Disse o Dádá.
Acomodei-a no sofá da sala e fui preparar algo para o nosso pequeno-almoço, para mim, para o David e para a Rita. Depois do menino tomar banho e vestir-se, tomou o pequeno-almoço que tinha preparado e despediu-se de mim e da mãe e foi entretido com ela. Fiquei sozinho em casa com a Rita. Já tinhamos tomado o pequeno-almoço e arrumavamos a cozinha, durante a refeição não trocamos uma palavra. Até que decidi arriscar:

-Rita. – Ela olhou-me e pela primeira vez naquele dia trocamos olhares.

-André. – Olhou para mim e eu vi o arrependimento no seu olhar. Não sabia o que dizer. – Desculpa-me. – Baixou o rosto.

-Anda cá, pequenina. – Estiquei os meus braços para ela me poder abraçar. Ela levantou-se e obedeceu-me. Senti-me reconfortado, sentia-me feliz como nunca naquele mês e meio, senti-me genuinamente feliz e bem, arriscava-me a dizer completo. –Podes chorar se quiseres, vai-te fazer bem deitares cá para fora todos os teus sentimentos e quando estiveres pronta falas. E se te custar menos fala comigo enquanto teu melhor amigo e não enquanto teu namorado. – Ela abraçou-me mais fortemente e não me respondeu. As suas mãos estavam nas minhas costas e as minhas nas dela. Peguei-lhe ao colo e levei-a até ao quarto. Sentei-me na cama e encostei as minhas costas ao móvel e estiquei as minhas pernas, ela aconchegou-se ao meu peito e chorou, chorou. Era um choro que me deixava aflito, queria poder ajudá-la mas sentia que se abrisse a boca, ela ficaria pior. Chorou bastante até se acalmar, até parar com os soluços das lágrimas. Não lhe disse nada, sabia que iria piorar a situação e ela acalmar-se-ia apenas a deitar cá para chora tudo o que sentia.
-André. – Olhei para ela, mas ela não teve coragem para me olhar também. – Nem sei por onde começar, as palavras são tão poucas e o que tenho para te dizer é tanto. Tu és o meu melhor amigo e eu vou contar-te a história do meu namorado, talvez assim seja mais fácil para mim. – Sorri, talvez fosse mesmo mais fácil para ela e para mim. –Eu conheço o André há dezanove anos e somos melhores amigos desde sempre, ele é o meu melhor amigo como tu, tem o mesmo nome e tudo devias conhecê-lo! – Sorrimos. Era incrível a forma como ela lidava com a vida. – Mas depois de eu ser mãe, ele veio para Lisboa lutar por uma carreira no futebol no Benfica, e afastamo-nos. Demasiado tempo na verdade. E ouve um dia que ele apareceu cá em casa por causa da minha prima e foi nesse dia do reencontro que vi que os meus sentimentos tinham mudado, mas ainda não sabia ao certo para o quê. Demos o primeiro beijo e apesar de ter sabido a pouco trouxe-me tantos sentimentos e dúvidas para a minha cabeça! Ele despertou em mim sentimentos mais... De mulher entendes? – Sorri. – Comecei a reparar no seu porte físico, na sua beleza, no seu charme, na sua barba que me picava mas derretia. Os sentimentos foram evoluindo e tornando claros na minha cabeça, o que o meu coração sabia desde cedo. Não, desde criança, na realidade nunca tinha pensado apaixonar-me por ele, mas desde que o revi. Desde o primeiro olhar, amor que foi construído com o tempo e atitudes. Eu pedi um tempo e espaço para pensar no que senti, e um dia ás três da manhã fui ter com ele e declarei-me. Foi a primeira vez que fiz amor com ele e senti-me completa a fazê-lo como nunca senti das outras vezes. No dia a seguir começamos a namorar e eu fiquei nas nuvens. Foi um dos dias mais felizes da minha vida quando começamos a namorar e a noite anterior foi inesquecível. Mas como a vida não é como queremos, fui despedida. E uns dias depois eu tomei a decisão de voltar para o norte. Ao inicio era só uma questão temporária, ia lutar pela custódia do David, mas arranjei emprego e decidi ficar por lá. Quantas vezes pensei em voltar e estar ao teu lado. – Pela primeira vez falava em mim enquanto namorado e não enquanto melhor amigo. Era um discurso direto. – E quando te vi no chão, a chorar, magoado, eu soube que não te queria, nem ia perder. O medo que eu tive de te perder, de me sentir responsável por isso mesmo, fez-me ter a certeza que queria voltar. Posso estar longe da minha família, mas tenho-te a ti, á Ana e ao David. Sei que enquanto não arranjar emprego, vocês me ajudam com o menino. Porque sei que é junto a vocês mas precisamente de ti que eu e o David queremos estar. Compreendo que já não querias ser meu namorado... – Não a deixei terminar a frase e coloquei um dedo sobre os seus lábios e olhamo-nos. Não queria deixá-la terminar e quando ela abria a boca para responder, eu calei-a. Beijei-a como se precisasse daquele beijo para sobreviver. Foi um beijo calmo, com luxuria, com saudade, deixamos demonstrar o mais puro dos sentimentos que nutríamos um pelo outro. Separamos os nossos lábios e ficamos frente a frente, a milímetros, toquei com o meu nariz no seu e os nossos olhares estavam próximos, “chocavam”.

-Não te quero perder por nada pequenina. Não voltes a dizer uma coisa dessas por favor! – Pedi com suplica. – Tu quiseste optar, tu sentiste que tinhas de o fazer. O David é o teu filho e no teu lugar eu teria feito o mesmo. – Vi um sorriso formar-se na cara. – Mas esqueceste-te de algo importante Rita, eu também sou teu amigo, o teu melhor amigo. Tu não abandonaste o teu namorado, abandonaste um amigo. Estarei a teu lado em qualquer altura, porque te amo. A ti e ao David. Amo-vos como se fossem minha família de sangue e vocês são a minha família, é convosco que vou criar o meu futuro e estou a criar o presente. Não te vou mentir e dizer que não me magoaste nem desiludiste, porque o fizeste. – Ela ia desviar o olhar mas eu coloquei as minhas mãos sobre a sua bochecha e fi-la olhar para mim. – Mas tu estás arrependida, eu sei, conheço-te, vi no teu olhar e sinto. Sei que não o farás e agora estás aqui do meu lado, na condição não só de amiga, como de namorada e me prometeste que não sairias de junto de mim. E eu amo-te, a ti e ao Dádá, amo-o como filho, como se fosse meu, eu ajudo a educá-lo, a mimá-lo, irei ajudar-te, se tu me deixares. Mas eu sinto que não é isso, penso que já te provei que quero ser um padrasto e estar presente na vida dele e na tua, sinto que não é isso que te incomoda, por favor fala comigo. – Ela virou o olhar e olhou para o horizonte, depois olhou para mim e sorriu. Confessou-me:

-Tenho medo. – Fez-se um silêncio que vinha com perguntas, ás quais não tinha resposta.

-Medo. Mas medo de quê? – Podia ser medo de tanta coisa. Medo do que sentia ou não por mim, medo do que eu sentia por ela. Tantos medos.

-Medo do que sinto por ti. É tão forte André, é tão... Bom e incrível. Mas é isso mesmo que me assusta. – Disse baixando o olhar. – Cada vez preciso mais de ti para mim, para conseguir superar o meu dia a dia, para sobreviver, para ser feliz. Não me chega só o David, eu preciso de ti! Eu amo-te André. E tenho medo de estar totalmente dependente de ti e que um dia a relação acabe e eu não saiba o que fazer e que o David pergunte por ti e eu não saiba o que dizer, não saiba dizer que tu já não és mais o pápá Gomas. Não sei se aguentaria isso. – Uma lágrima caiu-lhe pelo rosto. – Tenho medo que a nossa relação de amizade acabe, que o nosso amor morra, tenho medo que o meu futuro não seja do teu lado. – Nunca tinha ouvido uma dedicação de amor tão pura, tão genuína mas tão improvisada. Foi dita com o coração e não havia pessoa que me conhecesse melhor no mundo que ela. Deitei também duas lágrimas teimosas na minha face.

-Sinto o mesmo Rita. Eu nunca amei como te amo a ti e assusta-me, mas farei tudo para nunca vos perder, para vos ter sempre ao meu lado. Nunca vos irei perder, porque as relações de amor podem acabar mas as amizades, verdadeiras como a nossa não. Será sempre minha amiga e farei tudo para seres minha mulher e mãe dos meus filhos. Eu quero cuidar do David até aos meus últimos dias. Vocês neste momento são a minha vida! – Nós os dois já só choravamos a falar ou a ouvir o que se dizia.
Quando a Rita não consegue traduzir em palavras o que sente, beija-me  ou abraça-me, consoante o que achar mais adequado para a altura e para o sentimento que não sabia traduzir. E agora fê-lo, beijou-me. Foi um beijo como o anterior, calmo mas sentido. Traduziu o que ela não conseguia dizer por palavras e eu não sabia expressar. Aconcheguei-a nos meus braços depois daquele beijo e deixamo-nos ficar ali durante bastante tempo, eu respirava Rita, sentia o seu cheiro, o seu perfume, o seu toque, a sua presença, o seu sorriso e lembrava-me de todas as memórias que tinha da nossa vida, desde a infância até aos dias de hoje.

-André. – Hesitou. Tinha vergonha de perguntar alguma coisa, já a conhecia. – Tu queres casar? – Falar do futuro era andar um passo para a frente com ela. Sorri, de felicidade, ela queria construir O NOSSO plano para o futuro.

-Quero! Casar-me contigo e só contigo, mas primeiro quero namorar muito.

-Eu quero construir o nosso plano para o futuro. Preciso de saber o que queres também, preciso disso.

-Para mim não faz sentido casar-me pelo registo civil, se é para casar que seja pela igreja. Mas estou disposto a mudar conforme for o teu desejo porque não é a minha vida, é a nossa!

-Eu... Estou de acordo contigo. Sabes eu também tinha planos para o futuro com o Miguel, antes e depois do David, mas tudo morreu e era esse o medo que tinha contigo. – Confessou-me. – Mas contigo, eu sinto que é diferente. Está nos teus planos ser pai... Quer dizer depois do David é claro.

-Sim. Depois do David tenciono ser pai. Sempre pensei em dois/três, mas depois do David tive a certeza que quero três. O David tomará conta dos irmãos, um menino e uma menina. E tu? Está nos teus planos para o nosso futuro?

-Sim. Quero ter mais dois, sei que dão trabalho e se for como o David muito iremos sofrer! – Sorrimos. – Mas sei que tenho o melhor pai para eles! E o David toma conta da menina e do outro menino também! Quer dizer não escolhemos, mas eu gostava que assim fosse.. E nomes? Eu gosto de Mariana e Rafael, mas de tantos outros nomes.

Simão, não! Já tenho um cunhado com esse nome! E é o segundo nome do nosso pequeno, e David já há um por isso estão fora de questão. Também gosto de Catarina, mas sempre disse que se algum dia tivesse uma menina o primeiro nome seria Ana, até para honrar a minha prima e homenagear a minha avó. Meninos, só não quero ter um “André Júnior” cá por casa, isso não gosto...

-Ficaria uma confusão de nomes, estou de acordo! Mas Júnior no nome também não é grande ideia. Gostas de Ana Beatriz? – Perguntei. – Podíamos sempre tratá-la por Bia, e depois quando nos chateássemos usávamos os dois nomes.

-Gosto muito! – Disse ela sorrindo.

-Para menino: Rafael...

-Filipe! – Disse ela. – É o teu segundo nome e honrar-te-ia! – Sorri.

Falamos dos nossos planos para o futuro, sempre juntos, falamos dos nossos medos, dos nossos pensamentos e sentimentos. Foi bom, sentia que ela estava disposta a tentar o nosso futuro. Não demos pelo tempo passar, e já era tempo de almoço. Pensei em preparar algo rápido mas como a fome estava “negra”, precisava de repor forças. Por isso preparei empadão de peixe, a Rita adora e eu sinto-me sempre bem servido. A Ritinha recomendou-me ir ao médico, para ver o grau da sua lesão. Dei-lhe ouvidos e fomos até ao Caixa Futebol Campus, fi-la acompanhar-me. E era o que se suspeitava. Uma paragem entre duas e quatro semanas. Iria afastar-me da equipa e dos planos do treinador, era difícil mais tarde regressar mas iria lutar, desta vez tinha-a a ela e ao David do meu lado. Regressamos para casa e começamos a namorar, a apreciar a boa companhia um do outro. Não sabiamos a que horas regressava a Ana, o Salvio e o menino, mas ainda deviam demorar. Pelo menos assim esperava.
Entre brincadeira, peguei-a ao colo e levei-a até ao quarto, ela queria, tinha sido ela a sugerir-me irmos até lá, gostava que ela se tivesse “solto” para mim, gostava daquele lado mais provocatório dela, o seu lado mais á vontade enquanto namorada. Deitei-a e ela escondeu-se sobre os lençóis e eu fiz-lhe companhia, a temperatura não era agradável, era um mês de Fevereiro e era o mais certo para nenhum dos dois ficar doente. Começamo-nos a beijar enquanto nos despíamos, sempre apaixonados e cientes do que fazíamos, tínhamos morto saudades das nossas ternuras e carinhos, mas também daqueles momentos mais “quentes”, iríamos matar saudades dos nossos corpos unidos. Estávamos já em fase de preliminares, apenas em roupa interior, o corpo dela estava sobre o colchão e eu conseguia admirá-lo, o quanto eu gostava dele, daquele corpo, daquela menina com corpo de mulher. Do quanto eu a queria só para mim, e por um momento ser egoísta e tê-la só para mim. Estava a beijar-lhe o pescoço, preparando a minha última investida. Tirar-lhe o soutien enquanto lhe beijava o rosto, ela tinha as mãos agarradas ás minhas costas. Mas ouvimos a porta a abrir atrás de nós e uma voz reguila dizer:

-Dê! – Exclamou admirado. – O que táx a faze em cima da mãmã? – Tinha sido totalmente apanhado desprevinido. Não contava e nem tinha pensado que tal aconteceria, em qualquer pensamento. Não tinha sido por falta de preocupação e prevenção, até tinha encostado a porta do quarto para evitar isso mesmo, mas aquele menino tem o dom de surpreender.
A Ana e o Salvio apareceram enquanto o menino olhava para nós e dizia o meu nome. Não sabiam o que fazer e muito menos o que pensar, eles sabiam o que iamos fazer mas não esperavam ver-nos assim. A Ana pediu “desculpa” com os lábios e eu continuava sem reação. Senti as mãos da Rita me empurrar para o lado dela e assim fiquei, sentei-me e deixei a manta cair, sendo visível o meu corpo enquanto a Rita tapava o peito.

-Vochês tão chem roupa? – Perguntou admirado. E nós não tinhamos mesmo resposta para ele. Como explicava a uma criança de dois anos que a mãe e o namorado iam fazer amor?

Como será que se safam desta “trapalhada”?
     Será que é desta que conseguem ser felizes? E iram realizar os seus planos para o futuro?

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Capitulo 30 - «Eu não goto dele! Ewe fala mal»


(Ana)

O novo ano veio cheio de esperança para mim. Esperança em dias melhores, em coisas boas para a minha prima, em coisas muito boas para mim e para o Salvio. 
Chamo-lhe Salvio, no dia a dia. Chamo-lhe Toto, quando estou com receio de lhe perguntar algo. Chamo-lhe Eduardo, quando o assunto é mais sério ou nem por isso. Tem sido difícil conciliar tudo. O afastamento da Rita trouxe algo à minha vida que nem eu sei explicar. 
Sozinha, não conseguia tomar conta do David e, por isso, fomos viver temporariamente com o André. Quando não estava eu, estava ele e vice-versa. Poderia ter sido com o Salvio, mas o David não gosta lá muito dele...outro problema.
Pensei que, contando tudo ao menino, ele iria aceitar melhor o Salvio na minha/nossa vida. Mas não...nunca lhe dirigiu a palavra, resmunga comigo porque quer estar com o Rodrigo e, ultimamente, nem me fala. 
Há noites em que o André fica sozinho com o David para eu estar um pouco com o Salvio. Quando estamos juntos eu não quero pensar em mais nada. Só quero o mimo dele e dar-lhe o meu. Pode parecer egoísmo ..mas é mesmo necessário caso contrário dou em louca. Ele, sabendo de tudo o que se passa, deixa-me ficar apenas nos braços dele a descansar e trocando alguns carinhos. Estamos bem os dois juntos, sem pressão do exterior, com muita calma, até porque a questão de o David não gostar dele incomoda-me. 

Recordação:

Numa bonita manha de Janeiro, Ana começa mais um dia de trabalho. Sentia-se cansada. Tivera quase a noite toda acordada a pensar como iria apresentar Salvio a David. O menino perguntava-lhe por Rodrigo e Ana não sabia ao certo o que responder. 
Estava Ana a trabalhar na recepção do Caixa, quando entra o seu companheiro. Ainda não se apelidavam de namorados...não usavam rótulos por ser tudo muito recente.
- Buenos dias, preciosa - disse-lhe Salvio, ao chegar ao balcão.
- Buenos dias, mi hombre - ambos sabiam que não se podiam beijar naquele lugar. Não hoje, nem daqui a uma semana. Ambos queriam manter a relação dos dois longe dos olhares do local de trabalho. Alguns colegas sabiam. Rodrigo e Ezequiel, pelo menos.
Para se cumprimentarem, mexiam na mão um do outro e trocavam os tipicos olhares de bons-dias.
- Pareces cansada.
- Dormi muito pouco.
- Então?
- Estive a pensar...em conheceres o David. 
- Sabes que não é preciso pressa nenhuma. 
- Sim...mas ele só me pergunta pelo Rodrigo e tu é que és o homem na minha vida agora.
- Quando estiveres pronta e souberes o que fazer, terei todo o gosto em conhecer o teu pequeno.
- Depois do teu treino falamos melhor, sim?
- Claro. Bom trabalho.
- Bom treino, meu amor - Salvio beija-lhe a mão e dirige-se para os balneários, enquanto Ana fica a fazer o seu trabalho. 

Mais tarde naquele dia:
Ana decidira que era dia de apresentar Salvio a David. Iriam aproveitar o fim do dia para isso. André ia buscar David ao infantário e levava o menino para casa. Enquanto isso, Ana preparava um jantar, com Salvio, em casa de André para quando eles chegassem. 
Estava ansiosa, reciosa, mas ao mesmo tempo sabia que o tinha de fazer porque Salvio era demasiado importante para não o incorporar na sua vida inteira. Tudo estava feito: jantar terminado, mesa posta e ainda uma sobremesa deliciosa esperando David. Ana estava à janela, impaciente. 
- Nunca mais chegam... - Salvio aproximara-se dela, rodeando a cintura dela com os seus braços. Este gesto, que tantas vezes era feito, tranquilizava-a. Dava-lhe aquela sensação de protecção  que nunca quis ter, mas que adora sentir. 
- Tens de ter calma. Se o David não reagir bem, havemos de arranjar uma solução para isso.
- Queria que ele se desse bem contigo. Como se dá com o André. Sei que é diferente, porque o André está a ser quase pai dele, mas tu...
- Eu farei de tudo para que ele me aceite na vida dele, sendo a pessoa que está com a prima dele.
Ana vira-se para Salvio, queria encará-lo para ver o que lhe ia no rosto. Encontrou um sorriso que a tranquilizou. 
- Como é que estás tão calmo?
- Acredita que não estou. Sei o quão importante isto é para ti e tenho medo do que o menino pense, mas sei que vamos fazer algo para que ele nos aceite aos dois.
- Mas tens de estar preparado. Ele vai fazer imensas perguntas, pode mandar uma boca mais descuidada... - Ana falava tão rápido que Salvio só a conseguiu calar com um beijo. Ambos o prolongaram, mas foram interrompidos pelo barulho da porta a fechar. 
De imediato, Ana afastou-se e esperou a chegada do seu primo à sala, impaciente. 
- Pima! - o menino avançava na direcção de Ana e, ao olhar para Salvio, correu para as pernas da prima e manteve-se lá agarrado - quem é ewe?
- David, a prima tem uma coisa para te dizer. 
- Eu vou deixar-vos aos três sozinhos - informou André que, de imediato, saiu da sala. Ficaram apenas Ana, Salvio e David. Ana sentou-se com o primo no sofá, colocando-o no seu colo e pediu a Salvio que se senta-se ao lado dela.
- David, para o mês que vem fazes três aninhos e tu já percebes muita coisa dos crescidos, não é?
- Chim.
- Então percebes que a prima, como outra rapariga qualquer, pode mudar de namorado. 
- Ewe é teu namoado? O Godigo!? - o menino ia a sair do colo de Ana, mas ela impede que ele o faça. 
- David...eu sei que gostas muito do Rodrigo. Mas...nós já não somos namorados...nunca fomos a serio. 
- Poque?
- Porque ele gostava de outra menina e eu de outro menino, mas gostamos muito um do outro.
- Mas não podes gostar de tantos!
- E não gosto...o Rodrigo é meu amigo, eu gosto muito dele como meu amigo, como gosto do Gomas, percebes?
- Acho que chim. E dewe? Como é que gostas? - perspicaz como sempre, David aponta para Salvio.
- A prima gosta do Salvio como gostava do Roberto. 
- Mas ewe fez choar a pima. 
- Isso foi porque ele foi embora.
- E ewe não vai?
- Não...por agora não - Salvio responde, em espanhol. David olha para ele, que sorria. Parecia que se ia dar alguma coisa entre os dois, mas...revelou-se ser o contrário.
- Tu gostas mais dele do que de mim? 
- É um gostar diferente. Eu e o Salvio gostamos muito um do outro com o coração e eu gosto muito de ti com o meu coração porque és o meu pequenino.
- E ewe é o que?
- Ele está com a prima.
- Namoado?
- Quase.
- Eu não goto dele! Ewe fala mal - David sai do colo da prima - eu quewo que namoes com o Godigo - o pequeno sai da sala, deixando Ana sem outra reacção a não ser deixar escapar uma lágrima. 
- Ei...estamos assim porque?
- Salvio...ele é um menino com uma personalidade difícil  Vai ser difícil que ele mude. Já com o Roberto foi o mesmo. Acho que se apegou demasiado a mim e não me quer ver com muitos rapazes.
- Vais ver que ele acabará por ceder. 
- Estou para ver é como vai correr o jantar. 
- Temos de agir com tranquilidade.
- Temos de tentar...
Ficaram os dois algum tempo sozinhos, até que aparece André que tenta chamar David para se juntar a eles. O menino não o fez e, só quando foi a hora de jantar, é que se juntou à prima, a Salvio e a André. 
O jantar foi difícil  O menino quis ficar ao pé de André e não falava com Ana. Salvio ainda tentou meter conversa com ele, mas sem sucesso. 

RECORDAÇÃO OFF

Nem com explicações da parte do Rodrigo, ou da Rita, o David não aceitava o Salvio. 
A Rita...continuava em Grijó, há quase dois meses. Estamos em Fevereiro e ela desde o inicio do ano que lá está. Primeiro porque foi tratar da custódia do filho e depois porque...quis ficar lá a trabalhar. Não a entendi...o André sempre a quis ajudar, eu também a consigo ajudar bem...mas ela, nunca quer depender de ninguém. 
Estamos a dia 13, amanhã é dia dos namorados e eu com uma pergunta em mãos desde ontem. O Salvio pediu-me em namoro. Pediu-me que o começasse a chamar de namorado, que ele me começasse a chamar de namorada e que não andássemos tanto às escondidas. 
Não lhe respondi...acabei por lhe dizer que ia pensar e quando dei por mim estava a dormir. Hoje...acordei e ele não estava cá. Tinha ido para a Alemanha com o Benfica para o jogo de amanhã com o Bayer Leverkusen. O André também tinha ido...e a minha missão começava.
Eu quero responder ao Salvio. Quero dizer-lhe o que realmente sinto. Mas para isso, tenho de estar cara a cara com ele. Sai de casa dele e fui até à do André. Peguei na mala de viagem e coloquei lá alguma roupa minha. Voltei a sair de casa e fui até ao meu apartamento e da Rita, haviam umas caixas que ela tinha cá deixado que tinham de ir para Grijó. 
Eu ia a Grijó. Ia lá deixar o David, o resto das coisas da Rita e depois...rumava para a Alemanha.
Fui até ao infantário do David e expliquei à educadora a situação. Ela acedeu ao meu pedido de o deixar sair e quando o menino chegou ao pé de mim não me falou...como já tem sido hábito. 
- Vou levar-te à tua mãe - disse-lhe um pouco fria...tive pena, mas precisava que ele me respeitasse e que me falasse, pelo menos. 
- Tá bem - dei-lhe a mão e levei-o até ao carro. Coloquei-o na cadeirinha e fiz-me à estrada - Pima?
- Diz, David?
- Vais leva-me à mamã poque não gosto do Toto?
- Agora chamas-lhe Toto?
- É o que os meninos chamam-lhe...
- Mas se não gostas dele...
- Pima?
- Sim?
- Tu gotas memo dele?
- Gosto muito David. 
- E ewe gota de ti?
- Há mais tempo que a prima. 
- E ewe não te faz chora?
- Não. Só lágrimas de alegria. 
- E dá-te pendas? E felores?
- Sim...já me deu.
- Pima? - estávamos a ter a típica conversa. ele pergunta, eu respondo.
- Sim...
- Tu vais ficar com ele?
- Eu estou com ele Dadá. 
- Mas...vocês domem juntos?
- Às vezes...a prima quando não está em casa do André está em casa do Salvio. 
- E poque é que vamos para a mamã?
- Porque a mãe pediu-me para te levar e...porque a prima tem de ir a um sitio.
- Onde?
- É longe.
- Mas onde?
- A prima vai ter com o Toto. 
- Mas ewe joga no Fenfica. 
- Sim. 
- E tá longe como o Gomas e o Godigo. 
- Pois está.
- Tu vais ter com ewe tão longe?
- Vou. 
- Poque?
- Porque amanhã é um dia especial e a prima tem que falar com o Salvio.
- Ewe faz anos?
- Não.
- Então é o que o dia?
- É o dia dos namorados.
- Pima...e se ewe for emboa?
- David, a prima gosta mesmo do Salvio e se tu gostasses dele ias deixar a prima muito feliz.
- Mas ewe não sabe falar.
- Ele é de uma língua diferente. É da Argentina. Tu és de Portugal e ele da Argentina.
- Tu falas como ele?
- Sim.
- Eu não goto. Não pecebo nada. 
- Então e se prometeres uma coisa à prima?
- O que?
- Que vais pensar com muito carinho e falar com a mamã, e quando eu voltar passas um dia comigo e com ele, prometes?
- Pode ser... - fiquei um pouco mais aliviada, mas não totalmente. 

A viagem foi longa e, quando chegámos a Grijó, o David estava a acordar. 
A Rita retirou-o do carro e ele despertou logo no colo da mãe. Eu levei as caixas para dentro de casa e, enquanto o David lanchava com a minha tia, a mãe da Rita, falei com ela na sala. 
- Rita...o David precisa de ti. Acho que também precisas dele. E precisas de mudar de atitude depressa  O André está a dar em maluco, ele gosta mesmo de ti.
- Eu estou a fazer o que é melhor para o David. 
- Não digo que não, mas não desperdices um amor. 
- Como é que vão as coisas com o Salvio? - ela desviou a conversa...como sempre o fazia. Eu já nem insistia. Se ela queria pensar, que pense.
- Vou ter com ele. 
- Hã?
- Vou agora para Leverkusen. Ele saiu hoje de casa sem a minha resposta ao pedido de namoro. 
- E o que lhe vais dizer? 
- A verdade. Quando regressar falo contigo que agora tenho de ir apanhar o avião - despedi-me dos dois e rumei em direcção ao aeroporto Sá Carneiro, no Porto. 

Cheguei a Leverkusen eram 21h30. Sabia perfeitamente o hotel onde é que os jogadores estavam. Tinha passado pela recepção a marcação da estadia deles, contudo, não fui para esse hotel. Fiquei perto, mas não queria que o Salvio me visse, se bem que a minha vontade era correr para os braços dele, mas queria surpreende-lo amanha, no jogo. 

No dia seguinte:
Acordei já eram 10h. Despachei-me e fui dar uma volta pela cidade até à hora do jogo. Não tinha dito nada a ninguém, queria mesmo surpreender o Salvio. Não queria que ele sentisse que não lhe dou provas do que sinto por ele, porque eu amo-o. Hoje, tenho essa certeza absoluta. Amo o meu Salvio. Amo o meu Eduardo Antonio Salvio.
O Salvio não jogou de inicio, nem entrou no decorrer da primeira parte. Mas o André tinha saído lesionado. Só espero que não seja nada de grave e que traga algo de positivo...para a Rita. Pode ser que lhe abra os olhos. 
Estava no intervalo e tinham ficado alguns jogadores a aquecer, entre eles estava o Salvio. Eu estava na primeira fila, mas ele não me tinha visto. O Rodrigo, que também estava lá no meio, esse tinha reparado em mim. Chamei-o e, já que estava por detrás do banco de suplentes do Bayer, acho que ele deve ter inventado uma desculpa qualquer para vir ter comigo.
- Que cê tá aqui a fazer?
- Preciso de falar com o Salvio...
- E não esperou que fossemos para Lisboa?
- Não dá Rodri...o Salvio fez-me uma pergunta e veio sem resposta.
- Já tinha notado que o cara não tava bem. 
- Mas ele disse alguma coisa?
- Não...mas tá pra baixo. 
- Eu preciso mesmo de falar com ele.
- Vou chamar ele pra vir aqui...calma, vem comigo - comecei a caminhar ao lado do Rodrigo, eu na bancada e ele na relva, até que chegámos ao pé de um segurança e, com um inglês surpreendente, o Rodrigo falou - ela está comigo - o segurança abriu a portinha de segurança e o Rodrigo levou-me para o túnel de acesso aos balneários e ao relvado - agora vou dizer a ele pra vir aqui. 
- Obrigada Rodrigo! - dei-lhe um abraço e ele saiu a correr. 
Esperei...alguns segundos até que o Salvio chegou ao túnel, também a correr.
- Tu? Que é que fazes aqui?
- É o que se chama uma...surpresa. 
- É uma surpresa mesmo. Porque não disseste que vinhas?
- Decidi tudo ontem de manha, quando reparei que te tinhas vindo embora sem resposta.
- Acordei cedo e tu estavas a dormir...não te queria acordar.
- E acabas-te por vir sem a minha resposta - aproximei-me dele, rodeando a sua cintura com os meus braços.
- Tens noção do sitio onde estás?
- Tenho... - disse, roçando o meu nariz no dele - Estou em pleno túnel de acesso ao relvado do estádio do Bayer, com o rapaz mais perfeito e maravilhoso à minha frente, o rapaz que a partir hoje chamo de namorado para sempre.
- O que é que acabaste de dizer? - ele sabia perfeitamente o que é que tinha dito, caso contrário não sorria daquela maneira.
- Eduardo, eu aceito ser a tua namorada. Estamos à dois meses juntos, sabemos coisas um do outro que basta um olhar para mudar tudo. Eu amo-te, meu Toto! - no mesmo instante em que acabei de falar, o Salvio beija-me, ali, sem qualquer problema, sem qualquer restrição. 
- Eu amo-te tanto, mulher da minha vida. Sabes perfeitamente que é a melhor coisa que me podias ter dado num dia como o de hoje.
- Daqui a um ano vais ter de te esforçar muito para celebrar este dia.
- Estás a imaginar eu e tu daqui a um ano?
- Imagino-me contigo para o resto da minha vida. A não ser que faças algo completamente estúpido e fora de série é que te deixo. 
- Eu amo-te tanto! 
- E eu a ti, meu amor - beijamo-nos mais uma vez. 
Era fácil, claro e pacifico falar com ele sobre o que sinto. As nossas conversas davam-me certezas, seguranças, tranquilidade e um à vontade gigante em estar com ele. O Salvio é o meu melhor confidente, o meu melhor amigo, o meu melhor apoio, a minha melhor metade. Sem dúvida nenhuma, tenho o homem da minha vida a meu lado. 
Antes que se juntasse ali muita gente, separamo-nos. O Salvio foi terminar o treino e eu voltei para a bancada. Até ao minuto 90 o meu coração não sossegou. Não sossegou enquanto adepta do Benfica, estar só 1-0 desde os 61 minutos não dá tranquilidade. Não sosseguei enquanto namorada. O Salvio entrou aos 58 minutos e cada vez que tocava na bola e fazia a magia dele deixava-me orgulhosa. Mas quando os alemães se aproximavam dele era um medo...mas tudo correu bem. O Salvio e toda a equipa aguentaram-se até ao fim e a eliminatória estava bem virada para o Benfica. Na Luz manda-mos nós e eles que se cuidem. 

Depois do jogo, o Benfica seguiu para Lisboa e eu fui com eles. O Salvio arranjou-me um buraquinho no avião e fui com ele.
Fiquei do seu lado...o que um jogador consegue fazer nos dias de hoje é impressionante, mas muito vantajoso para mim.
- O que é que fizeste para que eu viesse a teu lado?
- Era o Ezequiel que vinha aqui por isso...foi mais pacifico.
- Vinhas com ele?
- Vou sempre. Quer seja em avião ou em autocarro. 
- Vocês dão-se bem...
- Damos.
- É bom saber. Assim o meu melhor amigo e o meu namorado podem falar mal de mim à vontade. 
- Falar mal de ti? Nunca, minha pequena - dito isto, ele beija-me e só se ouviu um coro atrás de nós. Eram o Cardozo e o Lima, que espalharam a palavra e num instante tínhamos o plantel todo a mandar bocas e a equipa técnica a rir.
Ele estava à vontade, já eu demorei algum tempo para levar tudo na brincadeira...não é todos os dias que a minha vida privada com o senhor Eduardo é analisada e comentada em pleno avião. Fizeram montes de perguntas, do género há quanto tempo é que estávamos juntos?
Quando pensei que as coisas não podiam piorar, chega Jorge Jesus junto de nós. E agora é que as coisas se tornam sérias...o mister é meu padrinho de baptismo. É quase como um tio, é amigo de longa data dos meus pais e, quando eu nasci, decidiram dar-me este padrinho...que hoje me deve ir chatear a cabeça com uma palestra, tal e qual como fez quando namorava com o Roberto, só que em casa. Ninguém sabia da nossa proximidade, apenas o presidente e alguns membros da estrutura do Benfica e equipa técnica: 
- Menina Ana, o seu interesse pelos meus jogadores continua, estou a ver.
- Mister...estar em contacto com eles todos os dias é o que dá.
- E a menina, por acaso, estava a pensar contar-me quando? Já que isto dura à dois meses...eu deveria ser informado. 
- Um dia destes...eu peço desculpa, mas não queríamos que as coisas se soubessem logo.
- O mister não tá falando sério, Ana. Não ligue pra ele! - disse o Lima...o problema é que ele estava mesmo a falar a sério.
- Rodrigo José, como é que sabes que não estou a falar a sério? - o plantel todo se riu...quando alguém tratava o Lima por Rodrigo José era sempre a mesma risada. 
- Mister, não precisa falar meu nome assim. Mas que cê quer da garota? Ela namora ele faz um tempão e ninguém tá notando. O Toto tá na mesma marcando gol.
- Vamos ver se nos entendemos...eu preciso de estar atento a esta rapariga. Se o pai dela me fez padrinho dela à 19 anos tenho de assumir as minhas responsabilidades - ai...bonito. Agora é que toda a gente fica a saber. 
No avião ouviu-se o comentar de todos, ou porque não tinham entendido o que o mister tinha dito ou porque não estavam à espera desta revelação.
- O mister é teu padrinho? - perguntou o Salvio.
- É...
- Por isso, senhor Eduardo, veja lá o que é que faz com a minha afilhada. E tu vê o que me fazes ao jogador porque não é para o andares a cansar todas as noites. 
- Padrinho...a serio!? 
- É muito sério. 
- Tirem-me deste filme... - escondi a cara no braço do Salvio, que se ria. Agora todos sabiam que eu sou afilhada do treinador...a ver como é que tudo corre. 

Chegámos a Lisboa eram 04h00 e, fui para casa do Salvio. Iriamos dormir. Juntos, na mesma cama, como namorados. Ainda não me tinha envolvido sexualmente com ele. Não havia essa necessidade, acho eu. Os momentos em que estávamos juntos eram tão intensos por si só que nunca pensei realmente nisso. 
Óbvio que há dias em que estamos mais relaxados e com mais vontade de tocar um no outro, mas nunca avançámos. Quero faze-lo, mas quando se der, quando for uma coisa natural, sem pressionar nada.

No dia seguinte:
Era dia de estar com o David. A Rita estava de volta e, para ela resolver as cenas dela, nada melhor que passar o dia com o Dadá. Não criei expectativas nenhumas para o dia, não o queria fazer, sabia que o pequnino era esperto e que percebe as coisas como ninguém. 

Fomos buscá-lo a casa e, quando sai com ele do prédio e nos dirigimos para junto do carro do Salvio...o bebé da prima revelou ser um homenzinho.  

Como irá correr o dia para os três?
Irá David aproximar-se de Salvio?

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Capitulo 29 - "Ele não vai desistir de ti!"



(Rita)

Sinto-me falhar. Tive de optar entre o meu filho e o meu melhor amigo. Por muito que o André faça parte de mim, por muito que ele seja meu melhor amigo, meu namorado, meu colega de infância, por muito que ele faça parte de toda a minha vida, não me lembro de algum momento da minha vida em que ele não estivesse presente, não sei como seria a minha vida sem ele. Enquanto o David é algo que não planeei no momento, não tinha pensado que acontecesse tão cedo, e provou ser o mais genuíno dos sentimentos, tem laços verdadeiros de sangue, sentimentos que por muitos anos que viva nunca os irei, nem de perto explicar. O André faz parte da minha vida desde o momento em que nasceu, um mês e uns dias depois de mim, o David faz parte de mim desde o momento em que era uma semente na minha barriga. São sentimentos muito grandes mas que são impossíveis de se comparar, são muito diferentes mas fazem parte daquilo que sou, era e virei a ser. Mas no momento em que tive de escolher não hesitei, pode parecer infantil, pode parecer que não tinha de o fazer mas na realidade tinha, não conseguia continuar assim, não pensei em duas vezes quando escolhi o David. Conseguia manter a vida que tinha até então, conseguia sobreviver e dar tudo ao meu filho que precisava, tinha ajuda da minha prima e do André, mas não era feliz sabendo que estava dependente doutros, eu não seria feliz e sentir-me-ia irresponsável e má mãe, sentia-me má enquanto pessoa. A Ana e o André ficavam com uma responsabilidade que não era deles, e não queria que fossem responsáveis por algo que não tinham qualquer responsabilidade. Não pedi ao André que compreendesse, apenas que aceitasse, não o queria magoar, cada dia que passa gosto mais dele, um bocadinho por muito pequeno que seja é mais dele, é mais uma parte minha que faz parte dele. Ele é o meu melhor amigo, o meu colega de infância, talvez o meu único verdadeiro amigo, é o segundo pai do David, mas que até tem tomado mais responsabilidades que o próprio, faz parte da minha vida e sempre fará, o sentimento aumenta e vai aumentando a cada momento, sempre que estou com ele gosto mais dele. Apaixonei-me não foi pelo sorriso, nem pelo olhar, não foi pelos seus beijos ou pelo seu toque, mas pelas atitudes, pelas palavras e por tudo o que demonstrou, por aceitar os meus problemas, o meu filho, e tudo o que a minha vida ia mudar a vida dele. 
O meu filho é a minha essência, a minha flor da vida, é genuíno, é uma versão minha mais pequena, é ele que me faz lutar, que me faz sorrir, sou responsável por ele, sou a mãe dele e ele é o meu pequenino, ele é a minha razão de lutar e viver, por ele cresci, aprendi, luto e sou feliz. Ele é algo que é inteiramente meu, apenas meu, é algo que não existe palavras para descrever. Ele é fruto de uma relação que embora acabada e passada, ele é o fruto daquele amor que me uniu ao Miguel, é fruto de um passado que me irá afetar, é obra viva de um erro, de uma relação desprotegida e de uma série de escolhas que afetou a minha vida, entre elas, a decisão de não abortar, de deixar de estudar para educar o meu filho e tudo o que tinha acontecido desde o momento em que soube que estava grávida. 
O David teve influência nas minhas relações com o André, tanto no amor como na amizade, e o André tem e teve influência em tudo o que envolve o David desde o primeiro instante, foi ele o primeiro a saber da minha gravidez e não me disse o que fazer, mas aconselhou-me e não me abandonou mesmo depois do bebé nascer. Ficou do meu lado e apoiou-me, aceitou o meu filho e apoiou-me enquanto melhor amigo e mais recentemente namorado, aceitou ser o segundo pai do menino e ficar do meu lado, aceitou uma responsabilidade que não é sua e estar ao meu lado. O David, foi graças a ele que eu me apaixonei pelo André, acho que se não tivesse sido mãe tão cedo não me teria apaixonado por ele, sinceramente, tenho de ser verdadeira e assumir que no início o que me conquistou foi o sentimento de amizade que existia entre ambos, o olhar do “Gomas” a olhar para o David, e senti-lo como se fosse... Do seu sangue. O sentimento de partilha, de carinho, de afeição, o orgulho que ambos sentiam, mutuamente. Sentia-me feliz pelo André amar tanto o meu filho e pelo David gostar tanto, de uma forma tão intensa do “pápá Gomas”, da forma como gostava que nós fossemos amigos mas também os incentivos e a (alguma) pressão que fez para sermos namorados. É certo que o David teve influência para a demora no início do namoro, não diretamente, mas graças aos meus medos, aos meus receios, mas também foi por causa dele que tudo o que nos rodeia, mas também foi graças a ele que tudo começou. Tudo na vida tem um significado, uma explicação e se pensar bem apenas consigo ver que a cumplicidade deles e tudo o que sentem tem significado, foi como se o destino os tivesse feito “trocar favores”, foi o André que me apoiou a mim e ao Miguel na decisão de termos o David quando mais ninguém nos apoiava, e foi graças ao meu filhote que comecei a namorar com o André, e pensando nisto, é irónico. Quando no começo deste ano, tive que vir passar algum tempo (indefinido) a Grijó, não me passava pela cabeça que tinha de escolher entre dois dos homens da minha vida num futuro tão próximo, fiz esta viagem até junto dos meus pais para lutar pela guarda do meu filho. 
O Miguel, pai do Dádá recebeu uma proposta de emprego de Madrid e mudou-se juntamente com a namorada, Renata para o nosso país vizinho, mas primeiro falou comigo e anunciou a sua decisão. Senti uma grande responsabilidade sobre os meus ombros, porque enquanto ele vivia no Porto e eu sei que se algo me acontecesse bastariam umas horas de carro e ele estaria junto ao nosso filho, enquanto em Madrid o menino ficaria ainda mais á minha responsabilidade, se era mãe solteira até então depois da despedida do Miguel fiquei ainda mais sozinha. Por muito que o André me apoie e me ajude existe atitudes e palavras que ele nunca poderia fazer, o pai era e sempre seria o Miguel, por muito que eu quisesse que não fosse, por muito que o David amasse e respeitasse o André e o André quisesse e amasse o David como tal e nos seus pensamentos fosse como seu, não era realmente de sangue. Tive uma conversa franca e matura com o Miguel, apesar de não sermos amigos, o único membro que ainda nos unia era o nosso filho e tomamos algumas decisões importantes. Apesar da distância, pai e filho falariam sempre que pudessem, tanto pelo telefone, como pelo twiter, instagram, facebook ou qualquer outra rede social. E sempre que o Miguel viajasse até Portugal tinha o direito de estar com o filho, caso tenha pago a custódia de alimentos do respetivo mês. Cujo valor aumentou devido ao melhor emprego que conseguiu e devido também ao fato de estar tão longe e ter menos influência na educação do filho, o valor deixou de ser 250€ para 450€, também devido ao importante fator de estar desempregada. Apesar do Miguel não gostar do André, teve de aceitar que ele era um segundo pai, devido á nossa separação e que me iria ajudar na educação do menino, devido á sua ausência era como um segundo pai, tinha quase a figura paternal do mesmo, apesar de alguns receios e medos de “perder” o filho teve de aceitar, afinal os “meninos” amavam-se e o pequeno tinha também alguém no papel de segunda mãe, a madrasta Renata. Mas os pais dele não foram da mesma opinião, então puseram um processo em tribunal para terem a custódia do David Simão, o que me obrigou a ir viver durante algum tempo para Grijó, onde lutaria pela custódia do meu filho. Mas tomei a decisão de o deixar no Seixal, longe de todos estes maus sentimentos, longe sequer de imaginar que estaria em causa ficar longe da mãe, para egoísmo dos avôs paternos que pensam que estar longe do pai e da mãe é o melhor para o pequeno, e porque não gostam do André, acusam-me de ser irresponsável e má mãe por ter um namorado. Podiam-me acusar de ser teimosa, má mulher, péssima namorada, podiam-me acusar de todos os defeitos que eu ouvia sem responder, mas não admito a ninguém, nem por um segundo que me acusem de ser má mãe quando me esforço e faço tudo pelo bem do meu filho. 
O processo deu entrada em tribunal e arranjei rapidamente um advogado que me aconselhou a procurar emprego para manter a custódia do Dádá. Como não conseguia arranjar um emprego estável até começarmos a luta pelo menino decidi recorrer aos meus pais. No início era só uma questão de tempo, ia ganhar a guarda do pequeno e ia voltar para o Seixal, para junto dos que amamos, e até arranjar um emprego contava com o apoio da minha prima e do André, mas a situação deixou de ser apenas uma questão de tempo para ser uma decisão definitiva. Até podia voltar para o Seixal e até conseguir um emprego contar com o apoio do André e da Ana, o menino até ficaria bem mas eu não me sentiria bem, não me sentiria feliz, não me sentia bem, não tinha de viver financeiramente á custa de outros. 
Nunca, mas nunca, nem por um segundo me esqueci do que estava a desistir, estava a abdicar do André, da nossa relação de amor que demorou 19 anos a ser construída, levou 19 anos a estar ao nível que está hoje, ele conquisto-me. Ele mudou-me enquanto pessoa, enquanto mulher, enquanto amiga, mãe e namorada, o André é incrível, tenho a certeza que gosto mais ainda mais a cada minuto que passa, cada segundo longe dele, longe de tudo o que ele me transmite sufoca. É mais que saudades, é um nível diferente deste sentimentos, mais intenso. Talvez estejamos numa relação há pouco tempo para lhe dizer algo tão sentido mas a cada minuto eu sinto mais e mais que o amo. Talvez sejam poucos os que compreendem o que eu sinto, é verdade, ás vezes eu pergunto-me se valerá a pena ter abdicado de algo que eu gosto tanto, algo que o meu filho goste tanto só porque me sentia melhor. Secalhar estava a ser egoísta e só pensar em mim, talvez não estivesse a fazer o melhor para ninguém e o mais certo era voltar para o Seixal e sermos felizes. Depois, conseguia ganhar consciência do que estava a fazer e acabava por aceitar que o que fazia era o melhor, o meu filho estava perto da família paterna e materna, estava também próxima da família do André. O menino seria feliz aqui. E eu também. Estava a fazer o melhor para o menino, pensava eu, ou talvez não, mas tinha de tomar uma decisão e decidi afastar-me do André, continuavamos amigos mas o meu coração continuava e ficaria sempre desfeito, a principal causa do fim da nossa relação era eu. 
Além de ter saudades de os ver próximos de mim, saudades de falar com a minha prima sobre tudo da nossa vida, dos nossos abraços, dos nossos beijinhos, das nossas palavras, do seu carinho e da sua amizade, bem próxima de mim, tinha saudades de tudo. Sim, ela está com o Salvio (ou Toto), ou Eduardo, ainda não descobri como lhe chamar, prefiro Toto na verdade, e é o que o David lhe chama e é uma alcunha bonita e simples. Queria sentir-me feliz pela felicidade dela, queria que ela me contasse tudo mas também ver a relação dele com o David, de os ver juntos. Estava a abdicar do meu romance com o André, mas também a afastar-me da minha melhor amiga e prima de sangue, mas irmã de coração. Queria, adorava, sonhava ajudá-la, aconselhá-la, tenho feito mas não consigo sentir tudo estando a esta distância dela. Tinha saudades da nossa conversa matinal (ou falta dela), das nossas “discussões para saber quem limpava a casa, para saber quem arrumava ou quem cuidava do menino, das opiniões que trocavamos. Tinha saudades do André, do seu perfume especial e único, inconfundível para mim, saudades de cruzarmos os dedos um do outro, do seu palmo da mão tocar na minha, dos seus beijinhos na testa ou na cabeça, dos seus beijos na bochecha, das palavras mais amigas ou das palavras mais românticas, das suas provas de amor diárias para o quanto me ama, ou ama o David, de me sentar no seu colo, ou até dos momentos mais intensos que passávamos  momentos mais íntimos vividos a dois na nossa cama. Do David sinto saudades do seu sorriso, dos seus gritos enquanto lhe fazia cócegas ou fugia de mim enquanto ameaçava que fazia, das suas palavras “especiais” ou a forma como ele dizia, trocando sempre os “r” pelos “g”, do seu jeito de “menino do seu nariz”, de se achar muito “senhor” mas também de assim que via o André, corria até ele e dizia: “Mãmã, mãmã olha quem chegou! Gomas” e ia a correr até ele a rir-se e começavam a brincar. Do seu jeito de jogar á bola, do seu “mau feitio” do sono. Tinha saudades de tudo o que envolvia aqueles três, até aos mais pequenino feito que enquanto estava com eles passava discreto, agora era úncio quando me lembrava, era especial.
No começo deste ano falava todos os dias com os três (com a minha prima, o meu namorado e o meu filhote), mandávamos mensagens, falávamos pela internet, pelo computador, a distância só não conseguia matar totalmente as saudades, não sentia os meus beijinhos dos meus homens, os desabafos da minha prima, não sentia algo mais “pessoal”, mas com o passar do tempo e com, cada vez mais certeza que iria ficar, definitivamente em Grijó deixei de falar com eles com tanta frequência, por vezes até quando sabia que o André estava fora é que entrava em contacto com a Ana e o David. E o André percebeu isto, a Ana evitava dizer-lhe mas o David, na sua inocência acabava por lhe dizer. Evitava falar com ele, não era pelo facto de não ter saudades, porque as tinha mas era pelo sentimento de lhe dar espaço e tempo e assim fosse mais fácil aos poucos e poucos aceitar a minha decisão e esquecer-me enquanto namorada, porque ficariamos eternamente amigos, acontecesse o que quer que fosse. Apesar da relação deles estar cada vez mais próxima, serem mais pai e filho, apesar de não o serem de sangue, sentiam-se como tal e eram quase como tal. Neste último mês e meio eles têm sido um pai e um filho, até se chamam “pápá Gomas” e “bebé Dádá”, mas o menino respondia sempre dizendo que já era um “homem”, será que passa pela cabeça de alguém ouvir uma criança de 3 anos dizer que já é crescido?! O tempo sem dúvida que passou a correr, ainda me lembro como se fosse ontem da minha gravidez, de ver a barriga a crescer, dos primeiros pontapés que ele deu na minha barriga, de saber que era um menino e só no final da gravidez termos acordado num nome. Sempre disse que os meus filhos teriam um nome original, que não fosse demasiado comum, mas que fosse simples. Quando descobrimos da gravidez eu disse logo que se fosse rapaz se chamaria David e o Miguel sempre disse que se chamaria Simão. 
O meu pequenino, apesar de todas as minhas tentativas que ele não entendesse o que se passava, acabou por perceber. O meu filho é atento e “muito senhor do seu nariz”, e um dia perguntou ao André a justificação disso mesmo e o André tomou uma atitude enquanto pai, decidiu contar-lhe a verdade. 
Era um domingo á tarde e os pais do André convidaram a minha família, eu e os meus pais a irmos jantar a sua casa, sempre os tratei por “tios”, eram quase como isso mesmo para mim, eram os pais do meu melhor amigo e eles sabiam, eram os pais do meu namorado, mas isso apenas sabia o meu cunhado Simão, ele sabia que era mais que uma amiga na vida do André, sabia toda a nossa história, tinha ouvido as duas versões da história e neste momento, era alguém importante para mim, era um verdadeiro amigo que nunca me tinha criticado, apenas dava a sua opinião. Era irmão do André mas sabia ver os dois lados da mesma história e entendi-a a minha vontade, a minha decisão mas incentivava-me também a voltar para o Seixal, para juntos dos que amo. Já tinha chorado no seu ombro bastantes vezes, ele tinha-me sempre limpo as lágrimas e dado milhões de motivos para sorrir. Era um verdadeiro amigo. O telefone tocou pouco depois de lá chegar juntamente com os meus pais, estava a conversar com o Simão depois de cumprimentar os meus tios quando o meu telemóvel toca. Era a Ana. Pedi licença, atendi a chamada e coloquei em alta voz:

 -Olá prima! – Não obtive resposta da parte dela, esperei alguns segundos e obtive resposta mas não a que queria.

-Pápá Gomas. – Ouvi a voz do meu filho a chamar pelo André e fiquei sem reacção  era uma nova forma como se tratavam, e eu não a conhecia. 

-Diz bébé Dádá. –  O Simão deu-me a mão e levou-me até ao seu quarto onde teríamos mais privacidade, ele conhecia-me sabia que o mais certo era começar a chorar. Segui-o, ele fechou a porta e continuamos a ouvir.

 -Poque é que a mãmã tá longe? Tenho mutas chaudades dela e ela diz que é pa meu bem mas num chei poquê eu quelo ela petinho de nós. Quelo mostal-lhe o meu novo golo e lhe dize que o Toto é nocho amigo agola. – O menino não podia ser mais directo  apesar do seu português “meio achinesado” entendi perfeitamente o que queria dizer, ele queria-me perto dele, queria que fossemos outra vez os quatro, ou melhor os cinco, porque o Toto já fazia parte da sua vida.

-David senta aqui. –  Disse o André. – Precisamos de ter uma conversa de homem para homem, mas tens de me prometer que te vais comportar como um crescido porque é o que tu és! E não te vais chatear com a mãmã! 

-Pometo! Pomessa de Dádá! –  Sempre que o David prometia alguma coisa era sempre como Dádá, assim como quando olhava para um espelho tinha uma “conversa” com o seu amigo imaginário Dádá, sendo ele o David. Durante esta minha estadia tinha-se perdido o hábito de lhe chamarem David Simão, agora era simplesmente David ou Dádá. Só quando ele fazia disparates é que passava a ser, e novamente, o David Simão. 

-Os teus vóvós –  Começou o André mas o menino interrompeu.

 -Já chou cescido Dê. – Ouvir o meu filho chamar Dê ao André em vez de Gomas? Estranho! Nunca tinha ouvido. – Chei que chão vós. – Na cabeça do pequeno ele já era um homenzinho porque dizia já saber as cores importantes como o vermelho do Benfica. Já sabia todas mas a favorita era a vermelha porque dizia ser a cor do “gorioso”. 

-Desculpa filhote. –  Senti-me nas nuvens, eram pai e filho, de coração. – Então eu conto-te tudo direito se tiveres dúvidas perguntas e eu respondo. Então o que se passa é que a tua mãmã teve de ir ao sítio onde tu nasceste porque os teus avós, os pais do teu pápá.

-Os teus papás ou os pápás do pápá Miguel? 

-Do pápá Miguel filhote Dádá. O teu pápá foi viver com a tua madrasta, a Renata para Madrid, que é em Espanha e eles querem que tu vás viver para ao pé deles, no sítio onde tu nasceste pequenino. Mas não é fácil, tem de tratar de coisas de adultos.

-Expica! Eu já pecebo! 

-Os teus avós puseram a mãmã em tribunal que é aquele sítio onde estão aqueles senhores com o martelo e decidem coisas importantes, coisas de adultos sabes? Vão lá decidir quem é que fica contigo meu bem.

-Mas eu goto de ti, da pima, do Toto, do Godigo e da mãmã não pocho fica com vochês poquê? E não podem fala aqui ao pé de nóx? Não pocho dize que não quelo tá com eles?

-Não pequenito, as coisas não funcionam assim e a tua mãe teve de ir lá ao Porto tratar de tudo para tu ficares cá. Só que são vários dias e a tua mãmã teve que lá ficar. Mas ela não queria que tu te chateasses com eles por isso foi e deixou-te cá connosco. 

-Max eu podia te ido e dize que não quia esta com eles nem com o pápá eu que-lo fica aqui! –  Respondeu convicto. 

 -Também quero que vocês fiquem aqui pequenino! Conheço a tua mãe desde que eramos bebés, desde que nasci e somos amigos! Esta coisa dos namorados começou há pouco tempo, e foi estranho, nunca tinha pensado nisso e tu foste o principal culpado!

-Max fiz mal? Não foi de poposito dexculpa! Max vochês não che vão cheparar como o Godigo e a pima poix não?

-Não fizeste mal nenhum pequeninho, fizeste uma coisa muito boa! Nós gostamos muito um do outro por amor, por namorados e vamos fazer tudo para não nos separarmos e ficarmos felizes mas tu tens de ajudar, a portar-te bem! E pode ser que depois tenhas bebés aqui em casa!

-Eu quê-lo bebés! Mas eles choam muito e depois tu e a mãmã deixavam de binca comigo! 

-Oh meu amor não iamos fazer nada disso! Iamos continuar teus amigos e brincar contigo como vai ser sempre mas iamos ligar mais um bocadinho ao bebé porque ele precisa mais de nós! 

-Ta bem. Podes liga á mãmã e dize que eu tenho chaudades e que-lo i buscá-la e falo com os avós pa fica com vochês?

-A mãmã foi jantar com os meus pais e com o meu mano, o Simão, lembraste?

-Chim! Acho que sim! Ele não tinha essa coisa que pica na cara como tu poix não?

-Não. E chama-se barba David. Gostas?

-Chim! Muito quando fo gande também que-lo te barba mas depoix vai picar chó contigo é que a mãmã não reclama que pica! 

-Ela já me disse mas não se importa, a tua mãmã gosta! E tu também e não te preocupes que quando quiseres ter eu fa-lo com a tua mãmã e ela deixa pode ser?

-Obigada! Então podemos ir joga um padinho á bola e depois tefonamos á mãe e ao teu mano? 

-Sim meu amor. Então vamos lá jogar á bola, temos é de avisar a prima!

Desliguei a chamada e abracei-me ao Simão.  Ele disse:
-Ritinha. Tu já sabias que isto ia acabar por acontecer.

-Sim, mas não estava preparada. O teu irmão não sabe o quanto eu gosto dele e esta relação tão próxima com o André, deixa-me orgulhosa mas também me mata aos poucos. –  A minha cabeça estava pousada no seu ombro e ele colocou as suas mãos nas minhas bochechas e fez-me estar frente a frente a ele, olhos nos olhos. 

 -Não te vou mentir, vou ser teu amigo como sempre fui e dizer-te a verdade. O André gosta muito, muito de ti e ama o teu filho como se fosse dele, ele não vai desistir de ti mesmo depois de tu lhe dizeres que vens viver para cá. – Já tinha confessado ao Simão que vinha viver em definitivo para Grijó. Também já tinha confessado á minha prima que não voltava mais para o Seixal mas não sabia como dizer ao André, queria dizer-lhe mas não sabia como. – E agora sou eu que te vou dizer algo que jurei ao meu irmão segredo. Ele ontem perguntou-me se tu vinhas para cá em definitivo, não lhe menti. Disse a verdade e que dentro de 3 dias, a Ana trás o menino e as vossas coisas para ficarem cá. Chorou, pela primeira vez em dezanove anos ouvi o meu irmão chorar, ele está desesperado, magoado, desiludido, ele ama-te, mas confessou-me que sente que tu estás a desistir dele, mas vai lutar por ti. – Abracei-me a ele e chorei. Não queria desistir do André, juro que não, amo-o de forma diferente do que amo o David, mas tenho cada vez mais a certeza que ele fará parte da minha vida até aos nossos últimos dias. – Não chores Ritinha, eu fiz isto para teu bem e não quero que acabe assim. 

-Não tenho coragem para falar com ele, quem sabe daqui a uns tempos, eu consiga dizer-lhe tudo. Não quero desistir dele e não o estou a fazer, mas tenho de abdicar e pôr os meus sentimentos de lado para bem do David. 

-Mas tu sabes que não é o melhor para o David, o melhor para ele era ficar junto do David, junto da tua prima, todos juntos no Seixal, desculpa dizer-te isto mas tenho de ser franco. Vocês os três vão sofrer, compreendo o que tu sentes e a tua atitude mas não posso ficar calado tu és minha amiga mas ele é meu irmão.

-Sou mãe dele, sempre serei e agora não quero falar mais disto. Desculpa. 

-Mais cedo ou mais tarde terás de falar mas eu compreendo. Mas vamos lá jantar que já estão á nossa espera e estranham senão formos.

A conversa acabou, ou melhor ficou adiada. Fomos jantar e os dias passaram a correr. Ganhei a custódia do meu filho, apesar de usarem todos os argumentos contra mim, até do facto de ter namorado, acusaram-me de o ter, e eu neguei. Disse que realmente tinha tido namorado, mas a relação acabara. Em tribunal iria defender o André com unhas e dentes, mas quem deu essa informação foi a minha advogada e eu respeitei, mas fiquei magoada comigo mesma por negar o André. Gostava demasiado dele mas as minhas atitudes diziam o contrário, e todos os dias quando me deitava na cama chorava, minutos ou horas, perdia a conta ao tempo que sofria pelas minhas atitudes, por estar a fazer algo tão... Desumano. Todos as noites chorava, sentia-me vazia e com vergonha de mim mesma, quase ao ponto de sentir alguma repulsa do que fazia.
Três dias passaram-me depois do jantar onde tinha falado com o Simão e escutado aquela conversa. Hoje era o dia, não o lembrava com felicidade, antes pelo contrário, relembrava o que o tornava tão especial pela negativa. Chorava. Estava a desistir do André. A Ana chegava ao final da tarde com a Ana, que trazia as minhas caixas, as poucas coisas que me pertenciam e ainda estavam no Seixal, era o último dia, o dia das decisões. O meu filho assim que me viu correu para os meus braços mas eu precisava de falar com a minha prima e a minha mãe levou para lanchar e nós trocamos alguns dedos de conversa:

- Rita...o David precisa de ti. Acho que também precisas dele. E precisas de mudar de atitude depressa  O André está a dar em maluco, ele gosta mesmo de ti. – era genuína e verdadeira, queria o melhor para nós os três mas eu não iria desistir da minha decisão final.

- Eu estou a fazer o que é melhor para o David.– Disse mas o meu coração queixava-se de uma dor profunda, era o melhor para ele mas não era para mim e para o André.

- Não digo que não, mas não desperdices um amor. – Confessou-me. 

- Como é que vão as coisas com o Salvio? – Fugi “com o rabo á seringa”. Não queria falar mais sobre isso, claro que nunca me iria esquecer mas não queria desabafar. E queria saber o que se passava com ela e com o Salvio, ela parecia feliz mas eu queria saber mais e perguntei. 

- Vou ter com ele. – Com esta é que eu não contava!

- Hã?

- Vou agora para Leverkusen. Ele saiu hoje de casa sem a minha resposta ao pedido de namoro. 

- E o que lhe vais dizer? 

- A verdade. Quando regressar falo contigo que agora tenho de ir apanhar o avião. – Despedimo-nos e ela foi embora para ir para a Alemanha, o quanto eu queria ir para lá também nem que fosse dar um beijo ao André, dar-lhe um abraço! Eu queria era estar junto dele. Queria que ele me abraçasse e me sussurra-se com os lábios encostados na minha orelha, minha pequenina. Nesse dia deitei-me na cama logo depois do jantar, ao tentar adormecer o David deitei-me ao lado dele e enquanto o menino dormia, eu abraçava-o entre os meus braços e chorei. Chorei toda a noite, sentia-me sufocar, quase com os pés cortados sem poder andar, o único feito que me animava era poder ter o meu filho do meu lado, sentir o seu cheiro de menino pequena e tentar endireitá-lo na cama, porque nem a dormir o traquinas pára quieto. Não dormi, não conseguia a minha cabeça estava longe, estava mais concretamente em Leverkusen, na Alemanha. 
O dia seguinte chegou, e apesar de não ter dormido estava com a mesma energia que se tivesse dormido, completamente de rastos, sem forças. 
O meu filho não percebeu que não tinha dormido, ele assim que acordava não ficava logo energético  ia aos poucos ganhando energia, por isso não estranhou nada. Ainda estava na fase do “dormir em pé”, mas assim que cheguei á mesa do pequeno-almoço a minha mãe percebeu que não tinha dormido, por muito que eu tivesse escondido com maquilhagem, ela não faz milagres e não taparam os papos gigantes que tinha debaixo dos olhos. Voluntariou-se a tomar conta do menino de manhã e á tarde, logo depois do almoço iria buscá-lo, conversavamos e assim, talvez, o menino me fizesse mudar de ideias, segundo a teoria da minha mãe. Despedi-me do meu pequenino, voltei a vestir o meu pijama e fui deitar-me, mas mal pousei a cabeça na almofada,  adormeci. Por muito que a minha cabeça deitasse ideias outras mais loucas e outras mais sãs, o meu coração batia sempre no mesmo sentido: André! Adormeci a pensar nele e foi impossível não sonhar com ele. 

Sonho 

Era precisamente dia 14 de Fevereiro, dia dos namorados, e véspera do dia em que devíamos celebrar 2 meses de namoro. Mas a nossa relação chegou ao fim, eu terminei mas não estava bem, precisava de me animar. O Benfica jogava e era das poucas oportunidades que eu tinha de ver o André, mas também de distrair-me, sofria por aquele clube e apesar de ver o André, a minha cabeça e o coração só sofriam pelo clube, como nortenha não devia ser benfiquista, mas foi um gene partilhado pela minha família e sempre me lembro de ter sido, desde muito pequenina. Duas horas antes do jogo envio-lhe uma mensagem com a letra de uma música para o animar: 

«Para: Meu Príncipe
“Tu és mais forte e sei que no fim vais vencer
Sim, acredita num novo amanhecer
Não tenhas medo, sai à rua e abraça alguém
E vai correr bem, tu vais ver”;
“Tu mereces muito mais
És forte, abanas mas não cais
Mesmo que sintas o mundo a ruir
Quando as nuvens passarem vais ver o sol a sorrir”;
“Limpa as lágrimas e luta
Segue o teu caminho e escuta
A voz dentro de ti
As respostas que procuras, dentro de ti
Acredita em ti que tu és
Mais forte e tens o mundo a teus pés”;
“Um dia tudo fará sentido
E vais ver que terás o prémio merecido”
Boss Ac: Tu és mais forte

Tu és mais forte e no fim vais vencer, existe apenas uma vida aproveita e sê feliz! Adoro-te com todo o meu coração mas tu mereces melhor, luta pela tua felicidade que o que eu faço é pelo David. Desculpa, adoro-te e espero que possamos ficar amigos serás sempre das pessoas que passou pela minha vida, e que a marcará.»

(Para quem não conhece a música aqui tem o vídeo: http://www.youtube.com/watch?v=Qc6QrEGiD_A)

Passado alguns minutos, sinto o telemóvel avisar-me que tinha uma mensagem. O nome continuava igual: “ meu príncipe”. Sorri, esperava que ele tivesse compreendido, que aceitasse. Fiz tudo para não o magoar, mas tive de escolher e talvez uma canção provasse melhor o que sinto do que as minhas atitudes.

«De: Meu Príncipe
"Desde o começo, não sei quem és, no fundo não te conheço
Se calhar sou o culpado, se calhar até mereço
Quis confiar em ti mas não deixaste, tu não quiseste
Imagino as coisas que tu nunca me disseste
Ás vezes queria ser mosca e voar por aí, pousar em ti
Ouvir o que nunca ouvi, ver o que nunca vi, nem conheci
Saber se pensas em mim quando não estás comigo
Será que és minha amiga como eu sou teu amigo?”;
“Apostei tudo o que tinha saí a perder, sem perceber
Surpreendido porque quem pensei conhecer”;
“Não peço nada em troca, apenas quero sinceridade
Por mais crua e difícil que seja, venha a verdade
Será que é verdade quando me dizes que me amas?
Será que alguém te toca em segredo? Será que é medo?
Será que para ti não passo de mais um brinquedo?
Será que exagero? Será que não passa de imaginação?
Será que é o meu nome que tens gravado no coração? Ou não?
Eu sou a merda que vês mas ao menos sabes quem sou
E sabes que tudo o que tenho é tudo aquilo que te dou
Nunca te prometi mais do que podia
Prefiro encarar a realidade a viver na fantasia;
A carta que eu nunca te escrevi
A carta que eu nunca te escrevi”
Boss Ac- A Carta Que Nunca Te Escrevi

Estou magoado, desiludido e triste contigo Ritinha, tu sabes aquilo que sinto e tu também sentes não percebo porque desististe sem sequer... Tentar. Estou magoado contigo porque enquanto minha namorada devias ter falado comigo enquanto amiga devias fazê-lo, e o meu filhote Dádá sai prejudicado no meio disto tudo. Adoro-vos aos dois».

(Para quem não conhece a música, tem aqui um site com a letra e música:

Acabei de servir as pessoas no café dos meus pais, e enquanto eu e o meu pai estávamos a ver o jogo do Leverkusen contra o Benfica, enquanto a minha mãe servia as poucas pessoas que faziam pedidos durante o jogo. Naquela rua havia muitos benfiquistas e anti-benfiquistas, e juntavam-se sempre todos ali no café para ver o jogo. O David esteve a brincar comigo durante a primeira parte do jogo, mas assim que entrou o André, o pequenino sentou-se ao meu colo a ver o jogo, o André entrou ao intervalo e passado nem 10 minutos de campo, um jogador da equipa adversária fez-lhe uma falta mais “dura” e ele caiu ao chão e precisou de ser substituído. Saiu de campo numa maca e com vários responsáveis médicos á volta. Senti-me gelar, estava a sofrer e não consegui conter as lágrimas, o meu filho também não estava bem. Chorei e não me consegui acalmar. Decidi então voltar para o Seixal, precisava de estar perto dele, merecíamos, os três ser felizes. Arrumei tudo e ainda consegui chegar a casa antes dele.

Fim de sonho

Dei um salto na cama de susto, o sonho parecia tão real... E eu não queria perdê-lo. A minha decisão estava tomada mas podia voltar atrás. Será que ele me perdoava? Fui tomar um banho para ver se as minhas ideias ficavam claras, mas nem o banho ajudou, o coração não limpava, nem esquecia nem com água, nem com álcool. Nenhum betadine iria fazer qualquer cura, o único que curava este mal era o tempo, mas eu precisava de estar com ele e decidi que não iria desarrumar as malas e as caixas da entrada da minha nova casa, consoante o jogo corresse para o André eu tomaria uma decisão. Mas também precisava de falar com o Simão e com o David. 
Fui buscar o meu filho ao café dos meus pais e vim para casa onde preparei o almoço favorito do meu filhote, ele estava um bocadinho triste, sentia-se perdido aqui no norte. Viveu já cá mas era tão pequenino que nem tem memória, e no Seixal tinha a Ana e o André, cá só tem a família, lá tinha os amiguinhos da escolinha e ainda o Rodrigo, e o Salvio. Quer quisesse ou não, mas embora me sentisse surpreendida, o menino tinha saudades do Toto, e explicou-me que a minha prima tinha ido atrás dele, tinha ido atrás de um amor. Talvez eu também devesse fazer isso. 
Preparei o almoço do meu pequenino, nos últimos tempos ele só comia massa, dizia que era a única coisa que gostava, então adorava atum com massa, e como a mãe adorava delícias do mar. Era algo muito prático de se fazer, e rápido, acabei por preparar para o nosso almoço, até porque da parte da tarde íamos passear com o Simão. Ele tinha pedido a tarde de folga para me animar, o meu pai tinha confessado ao seu pai e ele fez isto por mim, fiquei feliz, assim podia desabafar com ele, sentia-me mais “limpa”. 
Comemos e o menino adormeceu enquanto lavava a loiça, almoçamos mais tarde do que ele está acostumado e as sestas da tarde são religiosas para ele. Fui deitá-lo na nossa cama, porque era um hábito que tinha apanhado, queria uma cama de solteiro para os dois dormirmos, já estávamos habituados a dormir juntos e próximos, mesmo com calor ou com frio. O Simão tocou á campainha e fui abrir, cumprimentou-se com dois beijos e um abraço. Pedi-lhe para irmos para o quarto dos meus pais conversar, porque o quarto era logo ao lado do quarto onde o pequenino estava e o Simão fez-me a vontade. 
-Simão. – estava a olhar para o chão e não me ouviu, ou então apenas não me olhou. – Nuno Simão importaste de olhar para mim?
-Começo a pensar que é hábito os pais chamarem os filhos pelos dois nomes! Se for a contar isso então o André também chama David Simão ao pequenino. – Não esperava aquilo. Não queria que ninguém falasse comigo sobre esse fato, e muito menos esperava que o meu cunhadinho o dissesse, fiquei boquiaberta a olhar para ele. – Desculpa Ritinha, não quis. – abraçou-me e deu-me um beijo na testa. Interrompi-o.

- Sabes até tens razão. E é tão verdade que não dormi hoje por causa disso e esta manhã dormi mas acordei com um pesadelo, mas isto vai passar. O melhor para ele é eu estar aqui, é estar longe dele. Ele merece melhor e será feliz com outra pessoa, mas pode sempre contar comigo para o apoiar e ajudar porque os verdadeiros amigos continuam e continuaram para o resto da vida! – afastou os braços de mim e levantou-se. Abriu os olhos e respondeu:

- Pára Rita, pára por favor! Não aguento ouvir-te mais a dizer isso, estás a tentar convencer-te disso dizendo em voz alta mas não consegues, nunca vais conseguir-te porque o teu coração sabe que isso não é o correto. O teu coração de mãe diz que é o melhor para o David estar cá, mas o teu coração de amiga e namorada diz o contrário, e só és feliz se o juntares aos dois, faz um favor a todos se os amas, deixa isto e vai a correr atrás do André!  

- E por amá-lo tanto que me afastei, não quero que ele deixe de realizar os sonhos dele por nossa causa, quero que ele seja feliz e se depender de mim sofrer para ele ser feliz eu sofro! Quero é o melhor para ele. E o David irá compreender porque gosta tanto dele como eu e quer o melhor para ele! 

-O melhor para ele é estar do teu lado, é estar ao lado do David, é estares os três como família de sangue que são! Acredita no meu irmão e no que ele sente e no que tu sentes, acredita que o menino embora pequenino já entende bem as coisas. Neste momento dou-te duas opções: ou vais passear e arrefecer essa tua cabeçinha ou vais ter com o André, quer seja ao Seixal como a Leverkusen. Tens de aceitar a tua atitude, ou sofres com a tua decisão de te afastares dele ou vais atrás dele não podes continuar assim. – Abracei-o e soltei uma lágrima teimosa mas envergonhada, a minha vontade era de chorar até sentir aquele sufoco no meu peito passar, o que poderia nunca desaparecer, mas controlei-me e pensei que talvez ele tivesse razão. Tinha de pelo menos fazer crer o meu filho e os que me eram próximos que estava bem. 

- Obrigada Simão! Do fundo do meu coração, muito obrigada nunca vou conseguir agradecer tudo o que fizeste por mim! 

-Os amigos estão cá é para as ocasiões! – Abracei-o e ele agarrou-me com força entre os seus braços. Até que senti algo empurrar-nos, a separar-nos, perto das minhas pernas, olhei e era o Dádá. 

- Agoa namoas com ele? Gotas mais dele do que do pápá Gomas? Já não goto de ti! – Fugiu do quarto e eu fiquei preocupada, não queria que o meu filho pensasse que tinha deixado o André por causa de quem quer que fosse. Até o tinha deixado por causa dele. 

-David! – fui atrás dele em direcção ao nosso quarto, onde sabia que ele estava e estava deitado de barriga para o colchão, com a cabeça pousada na almofada a chorar. Fiz-lhe uma festinha na cabeça mas ele puxou-me e disse:

-Não mãmã, não queo, tu não gotas de mim nem do Gomas, só gostas do Shimão.

-Filho, não é nada disso! Eu vou explicar-te tudo mas quero que me oiças com atenção, vou explicar-te como se fosses um rapazinho grande pode ser? Mas tens de ouvir com atenção e calado. 

-Tá bem mãmã. – Sentou-se na cama ao meu lado e limpou as lágrimas.

-David, não é fácil. Gosto muito de ti e do André, mas tu és meu filho e tenho de tomar conta de ti sempre, mas não é fácil, tenho de dar-te de comer, de vestir, tenho de ter dinheiro para cuidar de ti, e só a trabalhar é que o consigo, e ao pé do André e da prima Ana, só conseguia por causa deles, eles é que me davam dinheiro. Então vim para cá, porque os teus avós queriam ficar contigo e comecei a trabalhar no café dos avós e viver com eles e conseguia ter dinheirinho para nós então decidi virmos viver para aqui. No Seixal tu tens os teus amigos, tens o Rodrigo, o Salvio, a Ana e o André, aqui tens a tua família e a família do André e aqui pensei que talvez fosses feliz. 

-Mãmã, tu gotas do Andé e ele de ti! Gosto muito dos dois vochês são os meus papás e que-lo que fiquem juntos e felizes! Não que-lo como os meus amigos que os pápás fiquem sepaados!  

-Mas o André tem os sonhos dele, ele gosta de ser jogador de futebol no Benfica e tu sabes disso, mas um dia ele pode ter de ir embora e nós David? Como ficamos?

-Vamos com ele! Tenho aqui os meus amigos e a pima, mas ela pode i connosco e leva o Toto. 

-E tu não te importavas de deixar aqui os teus amigos e a nossa família e irmos para longe, só para estar com o André? 

-Não. Vou te muitas chaudades mas podemos fala como eu e tu falavamos quando tava com a pima e tu tavas aqui! Eu que-lo o meu pápá e a minha mãmã juntos!

-Mas tu sabes que o André não é teu pai, eu é que sou tua mãe e ele não. É o teu padrasto, assim como a Renata é a tua madrasta. 

-Shim, eu shei. Mas na históia da Banca de Neve, que a pima me leu pa domir a madasta dela é má e é difíchil dize padasto e é feio tão chamo pápá Gomas e ele fica todo contente! E chama-me filhote Dádá, mas eu chamo David já sou cescido! – Fez “trombinhas”. E eu sorri. 

-Pois já meu amor! Mas agora vais-te deitar e dormir que a mãmã vai deitar-se ao teu lado mas primeiro vai só avisar o Simão pode ser?

-Mãmã pocho i contigo pedi desculpa ao Shimão? Ele é meu tio não que-lo que ele fique tiste! 

-Sim, claro anda meu amor! – Dei-lhe a mão e perguntei se ele queria vir para o meu colo mas ele não quis. Fomos até ao quarto dos meus pais e falei. – Simão, primeiro queria dizer-te que eu e o Simão vamos descansar um bocadinho mas podes ficar aqui por casa que vamos ver mais logo o Benfica. Mas antes o David Simão tem algo para te dizer.

-O que foi? – Ele baixou-se e ficou do tamanho do David. 

-Desculpa. A mãmã faou comigo e shei que ela gota muito do pápá Gomas como eu, e shei que tu és o meu tio, que-lo que fiques feiz! Fui mau, desculpa! 

-Eu desculpo pequenino! – Deram um abraço. – Posso pedir-te duas coisinhas?

-Shim. 

-Dás-me um beijinho? – O David Simão deu um beijinho ao Simão. – E prometes-me que tomas bem conta da tua mãmã? 

-Shim, eu já chou cescido já sei muitas coisas! Mas agoa. – Bocejou mas tapou a boca com a mão. – Eu e a mãmã vamos domi! Xau beijinho pota bem! – me a mão e levou-me em direcção ao quarto, deitamo-nos e acabamos por adormecer pouco depois.  
Depois de dormirmos, e eu conseguir descansar como não conseguia há bastante tempo, fui acordada pelo Simão, mas senti a cama vazia. Mas onde é que estava o Simão. Sentei-me na cama preocupada. 

 -O Simão? – Perguntei preocupada. 

 -Está na sala. O Benfica não tarda nada começa e ele quis que eu te viesse acordar para vires ver o André. Ele hoje é titular, anda preguiçosa! – Tentou levantar-me da cama e eu sentei-me nela. 

 -Dá-me 5 minutos e eu já vou ter convosco! Olhem pelos meus meninos mas principalmente pelo Gomas por favor! 

-Sim, mas despacha-te Rita Alexandra senão vem cá o menino reclamar contigo!

-5 minutos daqueles que passam a correr não daqueles do banho prometo! Vai lá que eu não quero que ele fique sozinho! E aproveita para lhe dares de comer senão ele fica rabugento!

-Eu sou um excelente tio e ele já lanchou! E fui! –  Saiu do quarto e eu fiquei sozinha. Fiz a cama e vesti a minha camisola do Benfica, onde nas costas tinha: 89, André Gomes. E fui até ao carro onde estava a prenda de Natal que o André tinha dado ao David. Trouxe-a, juntamente com as chuteiras que lhe tinha oferecido e entreguei-lhe que rapidamente vestiu com ajuda do tio antes de começar o jogo, e enquanto estavam a aquecer eu fui comer qualquer coisa, o que fez com que só soubesse o 11 inicial já quando o jogo estava prestes a começar.


Como é que ele era tão... Maravilhoso e encantador? Tinha conseguido pôr o sofrimento de lado e esforçar-se pela equipa. Fazia parte do 11 inicial e estava tão feliz, era bom ver o meu Benfica a lutar por um troféu daquele calibre, e num jogo assim, o André jogar. 
O jogo começou e aquele frio, aquela neve não me agradava, em nada, era propicio a qualquer lesão, a qualquer toque mais forte, ou uma escorregadela que os podia lesionar, e eu não aguentava ver o André assim. Mas a meio da primeira parte, o meu medo foi tornado real. Um jogador da equipa adversária, teve uma entrada infeliz sobre o André e eu senti-me gelar. 


Mas como é que tinham feito aquilo? Porquê? Não tive reação possível, ele era forte mas eu não o podia perder, nunca tinha conhecido a vida sem ele ao meu lado e não o queria nem iria perder. Senti-me impotente e fraca. Ele estava assim, por minha causa.


Cada instante que passava que ele não se levantava, eu sentia mais uma faca no peito, mais um sentimento mais forte de culpa. Era um dos piores sentimentos que tinha vivido na minha vida, senão o pior.
Abracei-me ao Simão e chorei. Não me consegui conter, não consegui disfarçar em frente ao David, era mais forte que eu. O Simão bem que me tentava acalmar mas era impossível, o David tentava o mesmo mas eu não conseguia ficar bem, tinha de lhe dizer o quanto o amava, o quanto o queria do meu lado, o quanto queria que fossemos uma família e fossemos felizes e nunca mais, iria desistir dele!
Quando ele saiu ao intervalo para entrar o Enzo, senti que a minha decisão era sem dúvida a mais certa.


Ele estava a chorar, como nunca o tinha visto na vida. Esteve no chão bastante tempo, o que me fazia querer que era bastante grave, e não o iria perder. 

-David, Simão, a minha decisão está tomada, vou voltar para o Seixal, agora mesmo! 

-Mãmã, o Gomas tá lá longe e a pima toma conta dele, pa imos te com ele temos de i de avião!

-Mas mais logo o André vai voltar e vai para casa e nós vamos estar á espera dele. Agora fica aqui que eu vou preparar alguma coisa para comermos pelo caminho! 

-Rita, espera pelo final do jogo e acalma-te conduzires nesse estado não é bom para ninguém. 

-Vou arrumar as minhas roupas e preparar o jantar para comermos e arrumar as coisas, avisar os meus pais e depois vamos e ninguém me vai fazer mudar de ideias!

-Shim mãmã, que-lo vota pa lá! Bigada! –  Deu-me um beijinho e um abraço. 
Desliguei completamente do jogo, não queria saber do resultado nem do que acontecia, o meu coração estava total e completamente entregue ao André. Arrumei tudo o que era meu em tempo recorde, preparei umas sandes e alguma comida para comermos na viagem e fui avisar os meus pais ao café da minha decisão. Estava decidida e nada nem ninguém, me iria fazer voltar atrás, sentia-me horrível, tudo o que lhe estava a acontecer era por minha causa e ele não merecia. Os meus pais ficaram felizes por mim e apoiaram-me, despediram-se do David e agradeceram o apoio do Simão. Consegui estar a postos a tempo, já no final do jogo e consegui ver o lance “de salvação do Benfica”. O grande corte do Melgarejo. 
Coloquei tudo no carro com ajuda do Simão, não consegui despedir-me dos meus sogros, mais tarde explicaria tudo. Despedi-me do Simão, o David ficou todo feliz, ia voltar para o Seixal, para junto dos amigos e eu, embora com o carro cheio e o coração destroçado, seguia para a terra onde viu o meu melhor amigo tornar-se meu namorado. O David jantou pelo caminho e eu preferi não comer, não conseguia, enquanto o meu estomâgo estivesse ás voltas. Liguei á minha prima e avisei-a que voltaria para o Seixal e ela não podia ficar mais feliz, voltariamos a ser uma família, os 51
Chegamos ao Seixal pouco passava das 23h, estacionei o carro num local longe de casa, para nenhum dos três (André e Salvio) verem o carro e só depois me verem. Queria surpreendê-los ao máximo. O David já dormia e eu decidi pegar nele, deixar tudo o que tinha no carro e só no dia seguinte me preocupar em levar tudo para casa. Foi bom passear na minha rua, onde tinha passado todos os dias nos últimos dois anos, o ar que se vivia bem junto ao rio, aquela rua que era de pescadores e quase todos se conheciam, onde apesar de pobre, eu era feliz. E respirava-se a cada canto, o Benfica, porque ter o Caixa Futebol Campus tão próximo, era impossível não sentirmos esse ambiente. 
Peguei no menino e abri aquela velha porta da entrada do prédio, era verde e a fechadura era daquelas antigas, em que se tinha de dar duas voltas e empurrar para dentro para conseguirmos abrir, era até daquelas pequenas coisas que sentia saudades. Subi, a custo até ao segundo andar daquele prédio sem fazer barulho, mas a pôr a chave na fechadura para entrar em casa, impossível era não fazer barulho, parecia que se estava a montar a terceira guerra mundial enquanto abria a porta de casa. Mas com a felicidade e ansiedade que eu sentia de viver de perto, de sentir próximo de mim o André, tudo me parecia maravilhoso, até o facto de levar o meu filho a dormir ao colo, e tentar abrir a porta de minha casa e não fazer barulho. 
Abri a luz da entrada e respirei novamente aquele perfume habitual daquela casa, era o cheiro da Ana, mas também o cheiro do André, eram os perfumes dos dois que se vivia naquela casa, mas também um perfume diferente, o Salvio já lá tinha passado e isso ninguém me podia desmentir. Pousei o David no sofá e despi-o, vesti-lhe um pijama que tinha ficado no quarto onde dormiamos e vesti uma camisola do André que estava no meu guarda-roupa, era o pijama que mais gostava. Ainda tinha o seu perfume, o seu cheiro, que tanto ansiava sentir próximo de mim.
Deitei-me no sofá junto ao David e queria ficar acordada até ao André chegar, mas não consegui e acabei por adormecer, agarradinha naquele sofá curtinho ao David, a fazer um esforço para ele não cair. Queria esperar que o André chegasse para o surpreender e me deitar ao seu lado, mas adormeci...
Só acordei quando “o” perfume entrou naquela casa, foi impossível não acordar, não sabia que horas eram nem queria saber, queria era deitar-me ao lado dele e matar saudades. Esperei que ele fosse para o quarto e peguei no David e fui-me deitar ao seu lado. Quando lá cheguei com o David ao colo, ao nosso quarto, o André já dormia. Estava cansado e não consegui chegar a tempo de lhe dar um beijo de boas noites. Deitei o David ao lado do André e eu do lado do David, mas precisava de tocar no André sentir que era real, e não era um sonho, por isso coloquei a minha mão sobre o seu peito e dei-lhe um leve toque com os meus lábios nos seus lábios e disse:

 -Amo-te pápá Gomas! – Depois fui-me deitar ao lado do David e pousei a minha mão sobre o seu peito, fazia-me sentir segura e adormeci com um sorriso nos lábios, sentia-me feliz e novamente, estranhamente confesso, em família. O dia seguinte seria longo, demasiado longo, mas esperava que ninguém acordasse durante a noite, o dia 15 de Fevereiro, dia do nosso 2ºmês de aniversário era de surpresas e não queria estragá-las de forma nenhuma! 



Como será que reagirá André? 
Será que vai aceitar Rita e David de volta? Como correrá o dia segunte?